23.9 C
São Paulo
quinta-feira, 12/12/2024

CLASSE DOMINADA – por João Franzin

Data:

Compartilhe:

Desde maio de 1985, trabalho para o movimento sindical, suas entidades, ou seja, as organizações da classe dominada.

Sou alguém que ascendeu à classe média, conseguiu formação superior, trabalha numa atividade que exige pouco esforço físico e utiliza as técnicas do jornalismo pra fazer comunicação e, na ponta final, ajudar a organizar dirigentes e trabalhadores.

A classe dominante forma quadros e dirigentes de modo permanente. Uma grande indústria, banco, enfim, uma organização capitalista investe décadas pra formar gestores.
A boa formação desses eleitos, apoiados na própria estrutura empresarial, torna a organização capitalista sólida e resistente.

No campo sindical não é assim. A formação é deficiente e há quem mesmo trabalhe contra essa ideia. Na organização sindical, existem a cúpula e a categoria. Diferentemente, o órgão capitalista tem a cúpula e a base, mas é composto por uma série de instâncias intermediárias: diretores, gerentes, chefes de seção, consultores e assim por diante.

Ou seja, a organização capitalista, além de contar com quadros mais preparados, funciona de forma orgânica.

No mundo capitalista, o conhecimento nunca se perde e o profissional qualificado raramente fica pelo caminho.

No mundo sindical, isso não é automático. Já vi dezenas (ou mais) de talentos serem deixados no caminho. Já vi muita gente boa se perder. Já vi gente qualificada se desorganizar. Já vi patrão detonar nossa organização. Já paguei prato de comida pra dirigente que antes falava grosso.

Ainda assim, o sindicalismo brasileiro é o melhor do mundo. E por quê? Por causa da estrutura concebida por Getúlio Vargas. O sindicalismo varguista não estava nem fora, nem dentro do Estado, numa relação ora de proteção, ora de pressão. Mais de proteção.

Como é essa estrutura? É simples como uma pirâmide. Na base, os Sindicatos, nas instâncias intermediárias as Federações e na cúpula as Confederações. Todo presidente de Confederação (ou seja, cúpula) um dia foi motorista, metalúrgico, pedreiro e assim por diante. Ou seja, é uma forma de organização que tem lógica e naturalidade. Falta, porém, um processo mais contínuo de qualificação.

Não é a formação acadêmica, clássica, porém. A formação do dirigente é igual à têmpera do soldado: ela é forjada no combate, ou seja, nas lutas, enfrentamentos, mobilizações, greves, campanhas e nas negociações. A outra formação é um complemento.

Sou um observador privilegiado do movimento sindical, pois trabalho para o sindicalismo sem estar dentro de uma entidade, e sim a partir da Agência Sindical, que, na prática, é um ponto de conforto. Essa distância permite ter uma visão aérea do processo e sua dinâmica. Quando posso, a partir dessa visão, intervenho e atuo. Quando não, recolho as armas.

Outro dia eu lia um conto em que Sherlock Holmes advertia Watson (que é médico) acerca de seus relatos. Ele dizia: – O problema, meu caro Watson, é que você dá muita importância aos acontecimentos e relega a lógica.

E quem relega a lógica se fode.

João Franzin, jornalista e assessor sindical
www.facebook.com/joao.franzin.1

Clique aqui e leia mais artigos de João Franzin.

Conteúdo Relacionado

Desafios para 2025 – Miguel Torres

Companheiros e Companheiras.Quero expressar a cada um de vocês a minha alegria de entrar em contato e desejar um ano novo repleto de saúde,...

O tempo passa – Artur Bueno da Silva

Sempre que nos aproximamos do final de ano, tenho a impressão de ficar mais ansioso: parece que os compromissos aumentam, assim como necessidade de...

Identitarismo e o capitalismo melhorado – Carolina Maria Ruy

Um novo esquerdismo juvenil ganhou força nos anos 1960, impulsionado por protestos pacifistas contra as guerras da Coreia e do Vietnã, e pelas campanhas...

O Brasil está no caminho certo – Clemente Ganz Lúcio

Nesta semana, o IBGE divulgou estatísticas importantíssimas que indicam que o Brasil segue uma trajetória de crescimento econômico, geração de empregos e redução da pobreza.A economia...

Dia de celebrar e valorizar o engenheiro – Murilo Pinheiro

Comemorada nesta quarta-feira (11/12), a data dedicada a homenagear a categoria é momento oportuno para a valorização desse profissional fundamental ao desenvolvimento e ao...