economia brasileira
Antonio Delfim Netto, professor, economista, escritor e ex-ministro dos governos militares

A CPI no Senado deve passar a limpo os meses de desgoverno que contribuíram para o descontrole da pandemia. Como seria de esperar depois de um choque imprevisível dessa magnitude, houve equívocos inevitáveis, e com eles só nos resta aprender. No entanto, é sobre os evitáveis, as omissões e os desvios de conduta que os esforços devem se concentrar para prestar contas à sociedade.

Para citar alguns, é preciso esclarecer o atraso na decisão de compra de imunizantes e a falta dos necessários protocolos unificados de atendimento aos pacientes, cruciais para o tratamento adequado, principalmente nos municípios com menor capacidade estatal. Para outros temas importantes, vale conferir a minuciosa lista de 23 crimes potenciais preparada pela Casa Civil, em mais uma inovação de gestão na pasta – essa, sim, sua maior contribuição para o Brasil.

É preciso, entretanto, que o circo político que naturalmente envolve os trabalhos de uma CPI não leve ao descaso com a realidade econômica e social. O Auxílio Emergencial e o programa de corte de jornadas e salários com compensação financeira pelo governo (BEm), além da ampliação do acesso ao crédito pelas pequenas empresas (Pronampe), foram decisivos para o bom desempenho do Brasil tanto frente ao esperado inicialmente, tanto em relação a outras economias. Apenas no Bem, foram mais de 20 milhões de acordos celebrados em 2020.

As disputas da política com “p” minúsculo em torno da eleição das presidências das Casas e que culminaram no espetáculo vergonhoso de apropriação de quinhões do Orçamento, com o estímulo do Palácio do Planalto, atrasaram a renovação desses programas, mas a sua retomada deve trazer novo alívio ao setor produtivo.

A atividade e o emprego formal têm mostrado certa resiliência mesmo com o recrudescimento da pandemia. Em que pesem as discrepâncias dos números da Pnad e do Caged, ambos trazem uma foto de recuperação do mercado de trabalho formal. A elevação expressiva da poupança financeira das famílias, como documentado em excelente trabalho do Centro de Estudos de Mercado de Capitais, pode ajudar a sustentar a retomada, mas o caminho será longo.

A busca pela geração de emprego e renda, sobretudo para os trabalhadores presos na informalidade, os de menor escolaridade e que mais sofreram com a pandemia, não pode ser sobrestada pelas consequências da CPI. Junto com a retomada da reforma do Estado, não podem ficar à margem das circunstâncias de curto prazo, por mais meritórias que sejam.

Artigo publicado dia 4/5, na Folha de S.Paulo

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