As Centrais Sindicais emitiram Nota reivindicando ao Supremo Tribunal Federal (STF) que os trabalhadores tenham acesso gratuito à Justiça do Trabalho. As entidades combatem as restrições impostas na Lei 13.467/2017 – a reforma trabalhista de Michel Temer.
Em sessão dia 14, o STF deu continuidade ao julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5.766, que discute a constitucionalidade dos dispositivos da Lei 13.467.
Segundo as Centrais, o voto do ministro Luiz Fux está alinhado ao voto do relator, ministro Luís Roberto Barroso. Ambos promovem análise econômica do Direito e argumentam que a reforma trabalhista buscou evitar o que chamou de demandas frívolas.
As entidades representativas dos trabalhadores afirmam ainda que exigir que a Justiça seja procurada apenas na certeza de procedência de seus pedidos é exigir um cálculo impossível de ser realizado. “Seria o caso, então, de se condenar em dobro sempre que se reconheça um direito não satisfeito ao seu tempo?”, indagam.
“O enfraquecimento dos direitos sociais, do acesso amplo à Justiça e da proteção social destroem a democracia, tanto quanto as práticas políticas que abertamente a desprezam e precisam ser combatidas”, argumentam as Centrais.
Para os sindicalistas, é necessário ter mais diálogo entre a Justiça e a classe trabalhadora, para ouvir e compreender os dados da realidade brasileira e a afirmação da Constituição de 1988, que fez prevalecer a valorização do trabalho humano sobre a liberdade econômica.
LEIA – Nota na íntegra abaixo.
Nota das Centrais sobre o Julgamento da ADI nº 5.766 pelo STF
Pleno acesso gratuito à Justiça do Trabalho
Na sessão plenária do dia 14 de outubro de 2021, o Supremo Tribunal Federal deu continuidade ao julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 5.766, que discute a constitucionalidade de dispositivos da Lei nº 13.467/17 relativos ao acesso de pessoas pobres à Justiça do Trabalho e à responsabilidade pelo pagamento dos custos do processo. A questão controvertida é específica: a efetividade do benefício da justiça gratuita ante os limites impostos pela “Reforma Trabalhista”.
O Ministro Luiz Fux, Presidente do Tribunal, alinhou-se ao voto do Ministro Relator Luís Roberto Barroso, para promover uma “análise econômica do Direito”, argumentando que a “Reforma Trabalhista” buscou evitar o que chamou de “demandas frívolas”.
Os dois votos, lamentavelmente, seguem a mesma linha e desconhecem por completo a realidade das trabalhadoras e trabalhadores brasileiros com ou sem registro em carteira. Dialogam com um mundo abstrato, citando autores e a Constituição estadunidense. Dialogam, apenas, com o grande capital e seus perversos efeitos sobre os mais pobres. Ignoram, abertamente, estudos promovidos por entidades como o Dieese, Cesit, Ipea e outras instituições que utilizam dados da realidade brasileira.
No Brasil, há recordes de taxas de rotatividade. Segundo dados e fontes seguras, mais de 60% da mão de obra empregada (vínculo formal) deixa o trabalho anualmente (taxa global que considera todos os tipos de desligamento). O que representa, em números, a totalidade da população de muitos países europeus. Parte expressiva dessas pessoas recebem até 2 salários- mínimos e não receberam seus direitos básicos. O número de processos judiciais deveria ser baixo, se isso fosse o resultado do elevado cumprimento dos direitos dos trabalhadores.
Exigir que o trabalhador procure a Justiça apenas se tiver “certeza” de procedência de seus pedidos é exigir um cálculo impossível de ser realizado. Limita, inclusive, o exercício da própria jurisdição. Seria o caso, então, de se condenar em dobro sempre que se reconheça um direito não satisfeito ao seu tempo? Disso não se fala, ao contrário, na ADC nº 58, ao limitar a aplicação de juros e correção monetária nos créditos trabalhistas judiciais, incentivou-se o mal pagador e a demora no pagamento de créditos de natureza salarial.
A “Reforma Trabalhista” foi apresentada como medida eficiente para gerar empregos. Não gerou. Não vai gerar. O que ela produz é mais precariedade, menos recursos para a grande maioria da população brasileira, empregos de péssima qualidade e desproteção social. É causa de insegurança jurídica e econômica para a grande parcela da população brasileira que vive exclusivamente de salário e não de renda financeira.
Para os Ministros, é legítima a atuação do Poder Legislativo buscando diminuir os números de litigiosidade aventureira no País, desconhecendo que, conforme estatística do Tribunal Superior do Trabalho1, a esmagadora maioria dos processos pedem pagamento de aviso-prévio, multa de 40% do FGTS, multa por atraso no pagamento, férias, 13º salário e outros itens básicos de puro descumprimento da legislação trabalhista.
Essa lógica de sequestro do Direito pela economia é atentatória aos Direitos dos mais vulnerabilizados; contraria a busca por emprego justo, salário decente e vida digna; impõe um cálculo de “custo dos direitos” a partir de princípios de eficiência e acumulação de renda e riqueza dos mais poderosos; afasta-se da perspectiva de bem-estar e da redução efetiva da pobreza; mantém uma economia de sobreviventes, com o discurso do mínimo existencial.
Enfim, seria preciso perguntar: quanto custa não ter Direitos?
O processo deverá ser retomado na próxima quarta-feira, na sessão telepresencial do dia 20 de outubro, colhendo os votos dos demais Ministros e Ministras.
Registre-se o voto divergente apresentado pelo Ministro Edson Fachin, que declarou a integral e completa inconstitucionalidade dos dispositivos questionados, ressaltando que “a gratuidade da Justiça se apresenta como um pressuposto para o exercício do direito fundamental ao acesso à própria Justiça”. Bem como a manifestação do Ministro Ricardo Lewandowski, que, na primeira sessão em que o processo foi examinado, fez um breve aparte para chamar a atenção dos colegas sobre a aplicação temerária da corrente “Análise Econômica do Direito”. Ressaltou que direitos fundamentais, como o princípio da dignidade da pessoa humana, não devem ser interpretados conforme critérios de eficiência e utilitarismo.
Essa é a linha decisória que nos anima a expressar o desejo de que o Supremo Tribunal Federal possa caminhar por rumo oposto aos dos votos apresentados pelos Ministros Luiz Fux e Roberto Barroso.
Não esperamos que o Supremo Tribunal Federal esteja à frente de seu tempo! Mas também não podemos concordar que esteja alinhado às teorias econômicas que debilitam o Estado Social e Democrático de Direito. O enfraquecimento dos direitos sociais, do acesso amplo à Justiça e da proteção social destroem a Democracia, tanto quanto as práticas políticas que abertamente a desprezam e precisam ser combatidas.
As importantes decisões proferidas por esta Corte em matéria de diversidade, saúde no trabalho e contra os ataques antidemocráticos ocorridos nos últimos tempos, devem ter o seu equivalente na afirmação dos direitos sociais e econômicos. Ambos são inseparáveis. Sem estes, também se está debilitando a Democracia e estimulando formas autoritárias e neofacistas, como se tem visto no Brasil e em parte do mundo.
Há uma extensa agenda trabalhista e sindical sendo examinada pela Corte que estão a exigir mais diálogo, mais abertura para ouvir e compreender os dados da realidade brasileira e a afirmação da Constituição de 1988, que fez prevalecer a valorização do trabalho humano sobre a liberdade econômica.
Brasília, 17 de outubro de 2021.
Sérgio Nobre – Presidente da Central Única dos Trabalhadores
Miguel Torres – Presidente da Força Sindical
Ricardo Patah -Presidente da União Geral dos Trabalhadores
Adilson Araújo – Presidente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil
José Reginaldo Inácio – Presidente da Nova Central Sindical de Trabalhadores
Antônio Fernandes dos Santos Neto – Presidente da Central dos Sindicatos Brasileiros
Edson Carneiro da Silva (Índio) – Secretário Geral da Intersindical Central da Classe Trabalhadora
Luiz Carlos Prates (Mancha) – Secretário da Executiva Nacional da CSP-Conlutas
José Gozze – Presidente da Pública Central do Servidor