Conjuntura: cenário interno sob controle e externo, instável – Antônio Augusto de Queiroz

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A conjuntura política e econômica, quando analisada sob a ótica dos fatores internos, apresenta cenário de relativa estabilidade, apesar dos desafios inerentes a País de dimensões continentais e complexidades sociais e institucionais. Mas, quando ampliamos a análise para o cenário externo, especialmente no contexto das relações internacionais e da economia global, a instabilidade e a imprevisibilidade emergem como fatores de preocupação.

Aqui, buscamos explorar essa dualidade, que destaca como o controle interno contrasta com a volatilidade externa e como essa dinâmica pode influenciar nosso futuro.
No plano político, o Brasil tem demonstrado capacidade de manter a estabilidade institucional, mesmo em meio à polarização política acentuada e à fragmentação partidária no Congresso. Eventos que poderiam gerar crises, como as eleições municipais, a votação do arcabouço fiscal e da Reforma Tributária, e a eleição dos presidentes da Câmara e do Senado, transcorreram dentro da normalidade democrática.

A escolha das presidências das comissões do Congresso ocorreu sem grandes sobressaltos, indicando que as instituições têm conseguido absorver e gerenciar as tensões políticas.

O Supremo Tribunal Federal tem sido outro fator de estabilidade. Decisões polêmicas, como as relacionadas às emendas parlamentares e à possível condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), não geraram os temidos impactos desestabilizadores. Isso sugere que, apesar dos ruídos políticos, há entendimento tácito entre os atores institucionais com poder decisório de que a manutenção da ordem democrática é prioritária.

Desafios
No plano econômico, os desafios são significativos, mas também parecem estar sob controle. A volatilidade do câmbio, a alta da Selic e a inflação de alimentos são problemas que remontam a decisões anteriores, muitas tomadas pelo Banco Central e agências reguladoras sob gestões passadas.

A especulação com o dólar futuro e o aumento das tarifas de energia, por exemplo, foram fatores que contribuíram para a pressão inflacionária. No entanto, com a nova gestão econômica, há expectativa de que esses indicadores voltem a patamares mais racionais, sem motivações políticas que possam agravar o cenário.

Externo
A principal fonte de preocupação é a imprevisibilidade das ações do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, cujas decisões frequentemente são tomadas com base em impulsos políticos e ideológicos, sem avaliação cuidadosa dos impactos globais. Essa imprevisibilidade pode ter reflexos diretos na economia e na política brasileira.

Um dos riscos é a possibilidade de Trump tomar partido em favor de aliados de extrema direita no Brasil, especialmente em reação à eventual condenação de Bolsonaro pelo STF. Tal cenário poderia gerar tensões diplomáticas e até mesmo retaliações econômicas, como a imposição de tarifas comerciais sobre produtos brasileiros.
Além disso, a regulamentação das big techs no Brasil e sua taxação, ainda que estejam em linha com iniciativas da OCDE, pode ser vista como ameaça aos interesses estadunidenses, levando a medidas protecionistas que afetariam negativamente as relações bilaterais.

Mercado
A sensibilidade do mercado a movimentos políticos é fator preocupante. Qualquer ruído nas relações Brasil-Estados Unidos pode gerar volatilidade nos mercados financeiros, impactando o câmbio, as taxas de juros e a confiança dos investidores. Nesse sentido, a capacidade de negociação política e diplomática dos dois governos será crucial para evitar conflitos que possam colocar em risco a tranquilidade interna do Brasil.

Paradoxal
A conjuntura política e econômica do Brasil, portanto, apresenta cenário paradoxal. Internamente, apesar dos desafios, as instituições têm demonstrado resiliência e capacidade de manter a estabilidade. No entanto, a instabilidade externa, especialmente em relação às ações dos Estados Unidos, representa risco significativo que não pode ser ignorado.

Pra mitigar esses riscos, é essencial que o Brasil fortaleça a diplomacia e as relações comerciais com outros parceiros globais, com redução da dependência de um único ator internacional. Além disso, a manutenção de políticas econômicas sólidas e previsíveis será fundamental pra garantir ao País continuar atraindo investimentos e mantendo a confiança dos mercados.

Em última análise, nosso desafio será equilibrar o controle interno com gestão externa proativa e estratégica, capaz de navegar pelas incertezas globais sem comprometer a estabilidade conquistada. A capacidade de adaptação e negociação, sem renúncia à soberania, será fator determinante para o sucesso nesse cenário complexo e dinâmico.

Antônio Augusto de Queiroz. Jornalista, escritor, analista e consultor político, mestre em Políticas Públicas e Governo (FGV). Ex-diretor ddo Diap, idealizador e coordenador da publicação “Cabeças” do Congresso.