Com país imerso em crises, governo insiste em ataques aos direitos e negacionismo

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Fausto Augusto Junior é cientista social
e diretor-técnico do Dieese

O PIB brasileiro desabou 9,7% no segundo trimestre de 2020, conforme anunciado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em relação ao mesmo período de 2019, o recuo foi de 11,4%, tombo recorde desde o início da série do PIB, em 1996. O desempenho da economia brasileira só não foi pior por causa dos recursos injetados na economia pelo auxílio emergencial de R$ 600, conquistado com muita pressão do movimento sindical e dos movimentos sociais, cujo valor agora o governo quer cortar pela metade.

Numa comparação mundial, o país ficou em 22º lugar entre as 48 maiores economias. Entre os membros do Brics, foi o pior desempenho. O resultado também ficou muito aquém dos alcançados pela Coréia do Sul, Indonésia, por vários países europeus e pelos EUA.

A indústria de transformação despencou 17,5% e os serviços, que caíram -9,7%, foram os setores que mais sofreram. A maior queda na indústria foi puxada pelo recuo na produção de produtos duráveis ou semiduráveis, como automóveis e vestuário, nessa ordem. Nos serviços, os maiores prejuízos ficaram com as atividades voltadas para as famílias ou relacionadas com lazer e turismo, que exigem mobilidade ou atendimento presencial e englobam, por exemplo, lazer, hospedagem, restaurantes, escolas, salões de beleza.

Entre os grandes setores, apenas a agropecuária teve alta, mas, ainda assim, pequena (0,4%). O resultado tem muita relação com a alta do dólar e as exportações de produtos como carne, soja e café, que representam, respectivamente, cerca de 20%, 10% e 7% de tudo o que é exportado do país.

A divulgação do IBGE também revelou que, no primeiro trimestre do ano, o buraco já era maior do que o anunciado antes da pandemia. O Instituto revisou dados e mostrou que o PIB caiu não 1,5% nos três primeiros meses de 2020, mas 2,5%. A crise do coronavírus e a forma como o governo decidiu lidar com a pandemia apenas aprofundaram ainda mais os problemas pelos quais a economia do país passava.

Os números do PIB e a assustadora marca de mais de 120 mil mortos demonstram que o governo errou ao subestimar a covid-19, incentivando os brasileiros a desrespeitarem as indicações das autoridades de saúde e entrando em conflito com governadores e prefeitos, que decretaram fechamento de vários serviços e o isolamento social, no auge da pandemia. O governo ignorou a ciência e a experiência internacional, colocando a questão econômica acima das vidas. Além de permitir que vidas fossem perdidas para a covid-19, não evitou a crise econômica. O país inteiro, mas principalmente os trabalhadores e os mais vulneráveis, pagam o preço de tantas escolhas erradas.

No mesmo dia em que se anuncia a derrocada econômica, o governo propõe cortar pela metade o auxílio emergencial, dos atuais R$ 600 para R$ 300, auxílio que minimizou a queda no consumo das famílias e evitou que a economia encolhesse ainda mais. A medida compromete a ajuda a mais de 67 milhões de brasileiros.

O “passado distante”, como se referiu o ministro Paulo Guedes aos números do PIB, ainda está bem presente na vida de milhões de brasileiros sem renda e sem emprego. A ideia propalada por ele sobre a recuperação em V de uma economia que já vinha andando de lado, antes mesmo da crise do coronavírus, assemelha-se às previsões feitas pelo governo sobre a pandemia, a qual o presidente da República chamou muitas vezes de “gripezinha”.

Se o auxílio for reduzido a R$ 300, o consumo será drasticamente impactado. O valor proposto não paga sequer para uma cesta básica mensal, como mostra a Pesquisa Nacional da Cesta Básica, do DIEESE. A proposta de corte no benefício é mais uma demonstração de que o governo pouco se preocupa com aqueles que mais precisam.

Além disso tudo, em vez de implementar medidas de estimulo à economia, que ajudem o país a superar a atual situação, como a tributação dos super-ricos, o governo propõe novas ações que visam à retirada de diretos dos trabalhadores e à inviabilização da garantia dos direitos sociais, como a reforma administrativa. Mais uma vez, cabe ao movimento sindical, movimento social e à sociedade civil pressionar o Congresso Nacional para proteger a Constituição Federal, conquistada a duras penas pela sociedade brasileira.

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