Garantir socorro e combater a precarização

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Murilo Pinheiro
Presidente do Sindicato dos Engenheiros do
Estado de São Paulo (Seesp) 
e da Federação da categoria (FNE)

Em meio a uma pandemia de desfecho incerto que ainda exige distanciamento social como forma de conter velocidade da contaminação, avolumam-se as preocupações sanitárias e econômicas no Brasil. Dados demonstram que no início do ano, mesmo sem os efeitos do novo coronavírus, o País já entrava em recessão. Desde então, obviamente, a situação só piorou.

A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad), divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 30 de junho último, traz número alarmante: pela primeira vez, desde o início do levantamento em 2012, o nível de ocupação da população economicamente ativa ficou abaixo da metade, apenas 49,5%.

A situação reforça a necessidade de se garantir socorro às famílias e à atividade produtiva nacional. É preciso que seja mantido auxílio emergencial pelo menos com o valor aprovado no Congresso de R$ 600,00, provavelmente além dos dois meses de prorrogação anunciados, e que as linhas de financiamento sejam acessadas efetivamente pelas empresas que verdadeiramente tentam manter seus empregados. Diferentemente do que prega a ortodoxia de planilha de visão curta, trata-se de garantir que haja um País após essa crise de proporções devastadoras.

As regras teóricas fiscalistas, já muito questionadas por especialistas que entendem do assunto, precisam dar lugar às urgências reais da população e da economia brasileiras.

Uma questão fundamental nesse processo é que o combate à crise não seja o pretexto para a ampla precarização do trabalho no Brasil, tendência crescente lamentavelmente desde a malfadada reforma na legislação feita em 2017. Uma economia realmente forte requer mão de obra qualificada, trabalho decente e proteção social.

Ao anunciar um novo formato para o programa “Bolsa Família”, que passaria a se chamar “Renda Brasil”, o Ministério da Economia já tenta ressuscitar a informalidade prevista no malsucedido contrato de trabalho “verde e amarelo”, criado por Medida Provisória, mas que não prosperou no Congresso. A ideia aqui seria que o cidadão migrasse da transferência de renda para um “emprego desonerado”, leia-se, sem as garantias previstas na legislação trabalhista vigente. No dia 1º de julho, um protesto dos entregadores de plataformas de venda de refeições tornou público o que talvez seja invisível para a sociedade: a superexploração do trabalho informal que muitos pretendem chamar de empreendedorismo.

Apesar de todo o cenário de dificuldades, há que se evitar a normalização dessa “uberização” do trabalho que ameaça inclusive atividades como a engenharia, que exigem rigor técnico. A tendência à desregulamentação afeta o mercado dos profissionais legalmente habilitados – que não são melhores que ninguém como pessoas ou trabalhadores, mas têm treinamento específico para exercer o seu ofício. Mais grave, representa risco à sociedade como um todo e vai na contramão do processo civilizatório.

Se o objetivo é construir um país e um mundo melhores, inclusive a partir do aprendizado com a pandemia, não é possível admitir a precariedade como tônica dominante. Sigamos na direção da prosperidade.